sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Mercosul dividido

Mais uma pedra atirada no teto de vidro do Mercosul... 


Argentina expõe divisão no Mercosul

28/11/2008

O Estado de São Paulo
Jamil Chade


Em documento aos 150 membros da OMC, país diz que não seguirá a liberalização comercial defendida pelo Brasil
O Mercosul está rachado e deixa isso claro à comunidade internacional. Ontem, a Argentina abriu fogo contra o Brasil e disse que a posição do Itamaraty nas negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) pode ameaçar o Mercosul e causar dano ao bloco. Sozinho, o país apresentou um documento ontem aos 150 países da OMC, no qual diz que não vai aceitar liberalização comercial nem seguirá a recomendação dos líderes mundiais de abrir os mercados por causa da crise. 
A posição contrasta com a do Brasil, disposto a fazer cortes mais profundos nas tarifas para produtos industrializados dos países ricos. Na avaliação do Itamaraty, as concessões terão de ser feitas para haver um acordo final. "O Mercosul precisa chegar a uma posição comum", diz o embaixador Nestor Stancanelli, negociador-chefe da Argentina na OMC. 
Pelas regras, o Mercosul precisa apresentar uma proposta comum de cortes de tarifas na OMC. Mas o bloco está distante de um entendimento. "Não estamos propondo isso em nome de todos. Mas é o que a Argentina acredita ser o melhor para o Brasil", afirmou Stancanelli.
Diplomatas confirmam que o alerta da Argentina é de que a posição do Itamaraty nas negociações pode pôr em risco a tarifa comum do bloco. "A união aduaneira é prioridade para a Argentina", disse Stancanelli.
Buenos Aires, porém, enviou a nova proposta aos demais países sem um acordo dos membros do Mercosul. No documento, o governo da Argentina pede para "manter certos níveis tarifários e preservar espaço para implementar políticas com a meta de expandir a base produtiva, aumentar empregos e garantir estabilidade social". Segundo o governo argentino, seu déficit na balança comercial não pode continuar crescendo, pois poderia ter "impacto na estabilidade social" do país.
Por isso, os argentinos querem que um acordo final na OMC corte em apenas 42% suas tarifas consolidadas de importação. Também querem proteções para 16% do comércio e 8% ficariam completamente isentas de qualquer liberalização.

2010 em 2008

Dor de cotovelo é duro. Já começa a eleição 2010 e já começa a campanha anti-Dilma 2010. Mas a oposição vai ter que caprichar se quiser derrubar a candidatura da Dilma. Essas representações só para aparecerem na mídia não terão muito efeito. 



DEM ingressa com representação na Procuradoria contra Dilma

Partido diz que ministra se utilizou do cargo quando foi saudada, durante encontro, como futura presidente

Sandra Manfrini - de O Estado de S.Paulo




quinta-feira, 27 de novembro de 2008, 20:05

BRASÍLIA - O Democratas (DEM) protocolou, conforme havia anunciado mais cedo, uma representação na Procuradoria Geral da República para que seja apurada a ocorrência de improbidade administrativa ou crime de responsabilidade possivelmente praticado pela ministra-chefe da Casa Civil,  Dilma Rousseff, e outros agentes públicos, durante evento com representantes de movimentos sociais ontem no Palácio do Planalto. Na ocasião, vários representantes dos movimentos defenderam a candidatura de Dilma à presidência da República, o que provocou aplausos favoráveis ao nome da ministra, presente à solenidade.

 

Segundo a representação encaminhada pelo DEM, pelas reportagens publicadas na imprensa, "se antevê que a referida solenidade, programada para divulgar os resultados do governo federal na área social, terminou se transformando num evento de natureza eminentemente política, dado que serviu para promover uma possível candidatura da representada à sucessão do atual presidente da República".

 

No documento, o partido político destaca que "há fortes indícios de que a ida dos vários representantes dos movimentos sociais ao evento" foi custeada pelo governo. Para o partido, não há dúvidas de que a conduta da ministra Dilma Rousseff ultrapassou os limites impostos pela Constituição Federal no que diz respeito ao veto da promoção pessoal de autoridades públicas.

 

Ao final da representação, o DEM solicita que sejam apuradas as responsabilidades e adotadas medidas cabíveis. Entre as providências pedidas está "declarar a perda da função pública, a suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, além de impor o pagamento de multa civil de até 100 vezes o valor da remuneração por ela recebida".

A mão "visível" do mercado

Sente que lá vem história... Mas essa é extremamente interessante! O artigo abaixo conta qual era a proposta de Keynes na conferência de Bretton Woods e o porquê foi escolhido o FMI. Keynes queria uma espécie de mão "visível" do mercado, controladora. Mas os interesses estadunidenses da época saíram "vitoriosos".


Não vale culpar Keynes
 

George Monbiot

O Estado de S.Paulo, 23.11.08


Na conferência de Bretton Woods, em 1944, o economista inglês John Maynard Keynes propôs um sistema engenhoso para convencer as nações credoras a gastarem seu dinheiro excedente nas economias das nações devedoras. Mas sua idéia foi rejeitada, e foi assim que nasceu o Fundo Monetário Internacional (FMI). Para compreender o motivo pelo qual a economia mundial continua entrando em crise, políticos - e jornalistas - hoje precisam compreender o que se perdeu em 1944. Keynes nunca foi tão criticado pela imprensa mundial como na cúpula do G-20 realizada na semana passada. Não propositalmente: a maior parte das mentes pouco brilhantes que noticiaram o encontro acredita que foi ele quem propôs e fundou o FMI.

A verdade é mais interessante. Na conferência de Bretton Woods da ONU, em 1944, John Maynard Keynes apresentou uma idéia muito melhor. Depois que ela foi descartada, Geoffrey Crowther - então diretor da revista Economist - alertou que "lorde Keynes estava certo ... o mundo lamentará amargamente o fato de seus argumentos terem sido rejeitados". Mas o mundo não lamenta, porque quase todos - assim como a própria Economist - se esqueceu do que ele propôs.

Um dos motivos pelos quais ocorrem crises financeiras é o desequilíbrio de comércio entre as nações. Os países acumulam dívidas em parte porque precisam financiar o déficit comercial. Eles podem tornar-se presas fáceis de uma espiral negativa: quanto maior a dívida, mais difícil será gerar um superávit comercial. Como Keynes reconheceu, as nações devedoras não têm muito que fazer.

Somente os países que mantêm um superávit comercial têm uma representação real, portanto são eles que devem ser obrigados a modificar suas políticas. A solução apresentada por Keynes foi um sistema engenhoso para persuadir as nações credoras a gastarem seus recursos excedentes nas economias das nações devedoras.

Ele propôs um banco global, a União Internacional de Compensações. O banco emitiria a própria moeda - o bancor - que poderia ser trocada pelas moedas nacionais a taxas de câmbio fixas. O bancor se tornaria a unidade monetária corrente entre as nações, o que significa que seria usada para medir o déficit ou o superávit comercial do país.

Todo país teria uma linha de crédito em sua conta em bancors na União Internacional de Compensações, equivalente à metade do valor médio de seu comércio em um período de cinco anos. Para que esse sistema funcionasse, os membros da União precisariam de um poderoso incentivo para a compensação de suas contas em bancors até o final do ano: acabar sem déficit nem superávit comercial. Mas qual seria o incentivo?

Keynes propôs que todo país que registrasse um grande déficit comercial (equivalente a mais da metade de sua capacidade de crédito em bancors) teria de pagar juros sobre sua conta. Também seria obrigado a reduzir o valor de sua moeda e impedir a exportação de capital. Mas - e esta era a chave do seu sistema - ele insistiu em que as nações com superávit comercial fossem sujeitas a pressões semelhantes. Todo país com um saldo de crédito em bancors superior a 50% de sua capacidade de crédito teria de pagar juros à taxa de 10%. Também seria obrigado a valorizar sua moeda e a permitir a exportação de capital. Se, até o fim do ano, seu saldo de crédito superasse o valor total do seu crédito permitido, o superávit seria confiscado. As nações com um superávit teriam um poderoso incentivo para se livrarem dele. Com isso, elas compensariam automaticamente os déficits de outras nações.

Quando Keynes começou a explicar sua idéia aos jornais publicados em 1942 e 1943, ela explodiu na cabeça de todos que leram a respeito. O economista inglês Lionel Robbins escreveu que "é difícil exagerar o efeito eletrizante para o pensamento em todo o aparato do governo ... jamais havia sido discutido algo tão criativo e tão ambicioso". Os economistas do mundo inteiro se deram conta de que Keynes solucionara o problema. Enquanto os Aliados se preparavam para a conferência de Bretton Woods, a Grã-Bretanha adotou a solução de Keynes como sua posição oficial nas negociações. Mas houve um país - na época o maior credor do mundo - no qual a proposta não foi tão bem recebida. O chefe da delegação americana em Bretton Woods, Harry Dexter White, respondeu do seguinte modo à idéia de Keynes: "Somos totalmente irremovíveis a esse respeito. Nossa posição é absolutamente não". Em lugar disso, ele propôs um Fundo Internacional de Estabilização, que deixaria todo o ônus da manutenção do equilíbrio comercial às nações endividadas. O fundo não imporia limites ao superávit que os exportadores bem-sucedidos pudessem acumular. Ele sugeriu também a criação de um Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento, que forneceria o capital para a reconstrução econômica depois da guerra. White, com o respaldo do prestígio financeiro do Tesouro americano, venceu. O Fundo Internacional de Estabilização tornou-se o Fundo Monetário Internacional. O Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento continuou sendo a principal agência de empréstimos do Banco Mundial.

As consequumlências, principalmente para os países endividados mais pobres, foram catastróficas. Agindo em nome dos ricos, impondo condições que nenhum país livre toleraria, o FMI os fez sangrar até secar. Como Joseph Stiglitz mostrou, o fundo agravou as crises econômicas existentes e criou crises onde não havia antes. Desestabilizou o câmbio, exacerbou os problemas de balanço de pagamentos, obrigou os países a se endividarem e a entrar em recessão, arruinou os serviços públicos e destruiu os empregos e as rendas de milhões de pessoas.

Harry Dexter White garantiu que os EUA jamais perderiam. Ele concedeu ao país poderes especiais de veto nas principais decisões tomadas pelo FMI ou pelo Banco Mundial.

No sábado atrasado, os líderes do G-20 admitiram que "as instituições de Bretton Woods precisam ser amplamente reformadas". Mas as únicas sugestões concretas que fizeram foram que o FMI deve receber mais dinheiro e as nações mais pobres "deveriam ter mais voz e representatividade". Já vimos o que isso significa: um aumento mínimo de seu poder de voto, que em nada contribui para contestar o controle do fundo que está nas mãos dos ricos e muito menos o veto dos EUA.

Estados Unidos e América Latina

O Editorial do New York Times falou hoje sobre a importância da América Latina para os Estados Unidos e disse que Obama provavelmente aprofundará as relações com esses países que ficaram esquecidos durante o governo Bush.  Defendem até o término do embargo à Cuba.


EDITORIAL

About Latin America

Published: November 28, 2008

The Bush administration is leaving behind so much turmoil and resentment around the world that President-elect Barack Obama might be tempted to put off dealing with the nation’s extremely sour relations with Latin America.

That would be shortsighted. There is a unique opportunity to improve ties with a region that shares key interests and values with the United States. And given how bad relations are right now, it will not take much more than good sense and sensitivity to make progress.

For starters, the Obama administration could gain a lot of good will by supporting more aid, mostly from the International Monetary Fund, for Latin American countries sideswiped by the financial meltdown.

More than anything, Latin American leaders want to know that Washington is ready to talk seriously — rather than just lecture — on important topics, including drug trafficking, energy policy, economic integration and immigration.

With Fidel Castro nearly gone, Washington should be testing the intentions of the new Cuban leadership. We believe lifting the economic embargo is the best way to do that. It has given Mr. Castro and his cronies a never-ending excuse for their failures and misdeeds.

During the campaign, Mr. Obama unfortunately agreed with the incorrect (but politically convenient) proposition that the embargo gives the United States leverage. Fortunately, he also said he would start the process of re-engaging Havana — and opening Cuba to the winds of change — by lifting restrictions on travel and remittances to the island. He should do so quickly.

Declining oil prices, and the declining stature of President Hugo Chávez of Venezuela, will also make Mr. Obama’s task easier.

We have no patience for Mr. Chávez’s corrupt and autocratic ways. But the Bush administration did enormous damage to American credibility throughout much of the region when it blessed what turned out to be a failed coup against Mr. Chávez.

The Venezuelan leader has played anti-American sentiments for all they are worth. And he has spent a chunk of his country’s abundant oil riches to prop up the Castro brothers and finance a wider anti-American bloc. He no longer has as much cash to spread around. And his own citizens have lost patience with his failed revolution.

Mr. Chávez’s decline also poses some new challenges. The finances of Cuba as well as Argentina, Nicaragua or Honduras could deteriorate rapidly if Venezuela decides to cut back its deliveries of cheap oil and billions in aid. Washington must be prepared to help, either with its own aid or by rallying support from international lenders.

There will be difficult pills to swallow. For the sake of American business and American credibility, Congress must pass the trade agreement with Colombia.

Other steps should come easier. Washington should open a regional dialogue about the illegal drug trade and prove that it can do its share by clamping down on the southward flow of weapons and reducing demand for drugs at home. On energy, eliminating the tariff on ethanol imports would help reduce dependence on fossil fuels and greatly improve relations with Brazil.

This country must move forward with immigration reform. It must also begin regular discussions on migration issues with the countries sending those migrants. That would do much to improve relations and find solutions to key problems like human rights abuses against immigrants.

If there is still a question about the need for a new policy for the region, consider these facts: Latin America provides a third of the nation’s oil imports, most of its immigrants and virtually all of its cocaine. And, oh yes, it’s right next door.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Delfim Neto critica parte da teoria econômica

Delfim Neto faz críticas à parte da teoria econômica que tentou ser a ciência "imperialista" das ciências sociais, a "rainha" das ciências sociais, mas que agora se vê frente à vingança das mesmas.

O progresso da teoria
21 de novembro de 2008
Delfim Neto

Nunca a corporação dos economistas esteve tão convicta de que é portadora de uma ciência capaz de ensinar aos governos, aos empresários e aos trabalhadores como devem se comportar para obter, respectivamente, a “boa governança” estatal, empresarial e o máximo bem-estar da sociedade. Nunca houve, também, tanta dúvida sobre essa possibilidade, que é o próprio objetivo da Economia Política desde a sua origem e que foi assim resumido por Adam Smith no fim do século XVIII: “A Economia Política, considerada um ramo da ciência dos estadistas e legisladores, propõe-se a dois objetivos. 1. Proporcionar ao povo um bom rendimento e uma abundante subsistência ou, melhor ainda, dar-lhe as condições de que ele mesmo o faça. 2. Proporcionar ao Estado recursos para que possa cobrir suas necessidades e realizar obras públicas indispensáveis. Em poucas palavras, ela se propõe enriquecer ao mesmo tempo o povo e o soberano”. (Tradução livre, A Riqueza das Nações, introdução do livro IV, 1776). 

Smith observou que o comportamento dos agentes econômicos atendendo cada um ao seu próprio interesse, mas coordenados pelo mercado, levaria a uma espécie de “ordem natural” com um sistema de preços que harmonizaria o interesse de todos (a “mão invisível”). Essa hipótese extremamente fecunda deu origem ao famoso homo economicus, que contrabandeou para a Economia parte dos teoremas da Mecânica. Alguns ainda permanecem disfarçados na atual teoria neoclássica. Em 1900, oNouveau Dictionnaire d’Économie Politique, de Say e Chailley, consignava (pág. 768): “Da mesma forma que a geometria elementar, a Economia Política também tem seus axiomas: ‘O homem procura obter o máximo de riqueza com o menor esforço’”. Disso ao homo economicus imortal, amoral, plenamente racional com preferências bem organizadas, em busca permanente de um extremo (máximo ou mínimo), com informação perfeita e conhecimento divino do cálculo diferencial foi um pequeno passo. 

O fato interessante é que, com seu poderoso axioma “cada um procura maximizar suas vantagens e minimizar os seus custos”, a Economia abandonou a Política e tornou-se apenas Economia, ou, na forma mais pomposa, Teoria Econômica. Tornou-se uma ciência imperialista e foi invadindo as outras ciências sociais. Criou, já no início do século XIX, uma psicologia sem conteúdo empírico. Invadiu a Sociologia, a História, a Geografia, a Antropologia e a Arqueologia e, com a fecundidade do axioma que facilitava a sua formalização, chegou a se tornar a “rainha das ciências sociais”. No esforço para tornar-se uma ciência, transformou-se num ramo bastardo da Matemática Aplicada, instrumento realmente indispensável. Para ser uma ciência, entretanto, ela precisa de menos axiomas e mais trabalhos empíricos. 

Assistimos agora à revolta e à vingança das “ciências escravizadas”. Pouco a pouco, elas foram corroendo a riqueza e coerência do poderoso axioma. Hoje, ele está sob o ataque empírico cerrado de um novo ramo do conhecimento, que estuda o funcionamento do cérebro, chamado genericamente de Ciências Cognitivas e que, por falta de melhor nome, os economistas estão chamando de Economia Cognitiva. Uma das vantagens das novas pesquisas é que o analista pode determinar qual é a “zona do cérebro” [constatadas eletronicamente por um equipamento chamado Imagem por Ressonância Magnética (IRM)] que responde a cada estímulo particular: racional ou emocional. Há duas conclusões preliminares, mas que se vão confirmando a cada nova pesquisa. 1. A análise das decisões em matéria econômica mostra que elas estão mais freqüentemente relacionadas às zonas ligadas às emoções do que àquelas supostamente ligadas à racionalidade. 2. Há uma rejeição completa da uniformidade de comportamento do velho homo economicus. 

Isso põe em sério risco duas grandes simplificações do modelo neoclássico: o agente representativo (que ilide o problema da agregação) imortal que maximiza sua utilidade num intervalo infinito e a teoria da expectativa racional. Em compensação, parece confirmar a intuição de Keynes, para quem o espírito animal dos empresários é mais movido pela emoção (o investimento depende, fundamentalmente, da expectativa do crescimento) do que pelo cálculo racional. 

A própria Teoria Econômica também está incorporando esses avanços. Em lugar de um agente egoísta, onisciente e amoral (o axioma original) coloca um agente mais frágil, que modera seu egoísmo com alguma ignorância, algum altruísmo e certa moralidade. E tem reconhecido a precariedade do seu conhecimento diante de um futuro inevitavelmente incerto. É assim, cada vez mais evidente, a necessidade de uma nova síntese teórica para cumprir o ideal de Adam Smith. 

Eleições venezuelanas

A pergunta que muitos tentam responder - "Chávez ganhou ou perdeu?" - não é simples de se respoder. Mais correto dizer que a democracia respirou um pouco mais.


TERÇA-FEIRA, 25 DE NOVEMBRO DE 2008

Venezuela: base governista enraizada e ampliada, oposição consolidada

Em meio à polêmica sobre quem ganhou e quem perdeu as eleições na Venezuela, um dado é relevante. O nascente PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela) obteve nas eleições locais de domingo quase 1,2 milhão de votos acima do "sim" governista derrotado no referendo constitucional do fim do ano passado. Foram agora cerca de 5,5 milhões de votos, contra 4,3 milhões do "sim" em 2007. O número indica que o partido, recém-criado por Hugo Chávez, conseguiu ampliar o enraizamento, ou então conseguiu mobilizar intensamente sua base, o que não ocorreu ano passado. Ou as duas coisas. Talvez porque a nova Constituição proposta (e rejeitada) propunha esvaziar o poder local mais tradicional. A oposição obteve agora 4,2 milhões, contra os 4,5 milhões do "não" no referendo. Ou seja, a oposição parece consolidada na sua fatia de mercado, com perdas numéricas apenas marginais entre os eleitores. O dados podem ser checados no site oficial abn.info.ve. (continua)

Lula e o G-20

Os avanços nas negociações do G-20 estão claramente ligadas à postura de Lula no encontro. De outro lado, Berlusconi mostrou grande dor de cotovelo quanto ao fato do G-8 ter ficado em segundo plano. 

O Brasil foi ouvido

As idéias que Lula levou a Washington, como a retomada da Rodada de Doha e o freio no protecionismo, foram os principais avanços na reunião do G-20

Isto é Dinheiro

DENISE BACOCCINA, enviada especial a Washington

SENTADO SEMPRE À DIREITA de George W. Bush, até outro dia o homem mais poderoso sobre a face da Terra, o presidente Lula foi um dos protagonistas da reunião do G-20, em Washington, definida por ele como um momento "histórico", que marcará a entrada dos países em desenvolvimento no grupo que toma decisões sobre a economia mundial. A previsão foi recebida com ceticismo por alguns, mas a verdade é que o Brasil conseguiu, sim, ser ouvido e colocar em pauta uma das principais bandeiras do governo nas relações externas: os países do G-20, que representam 80% do PIB mundial, se comprometeram a não adotar barreiras ao comércio internacional por um ano e a tentar um acordo para retomar as negociações da Rodada de Doha até o fim deste ano. As conseqüências práticas começaram a ser sentidas já nos dias seguintes. O diretor-geral da Organização Mundial do Comércio, Pascal Lamy, marcou uma reunião ministerial para o início de dezembro. Os embaixadores dos 30 principais países negociadores se reúnem já nesta segunda- feira 24, em Genebra para tentar uma agenda prévia. Na quinta-feira 20, a União Européia anunciou um acordo para a redução de subsídios agrícolas dentro do bloco, uma das exigências dos países exportadores agrícolas. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, entusiasta da Rodada Doha, está satisfeito com a movimentação em direção a um acordo. "Mais do que uma janela de oportunidade, há agora uma janela de necessidade", disse o ministro numa reunião em São Paulo, na quinta-feira 20, com o secretário de Agricultura americano, Ed Schafer. O compromisso do G-20 de rejeitar o protecionismo foi um passo importante. Havia um grande receio de que a crise levasse a uma reação protecionista, como aconteceu nos anos 30. Desta vez, ao contrário, ela parece levar o mundo em direção a um acordo comercial global.

Se no comércio os efeitos práticos ainda não estão aparecendo, na política o Brasil já conseguiu uma vitória com a consolidação do G-20 como o foro de discussão da crise e o compromisso do engajamento numa reforma do sistema financeiro internacional. O grupo financeiro do G-20, que conta com minsitros da Fazenda e presidentes de bancos centrais, foi criado na crise dos mercados ocorrida nos anos 90 e, atualmente, é presidido pelo Brasil. "Saio daqui com a certeza de que a geografia política do mundo ganhou uma nova dimensão", disse Lula, depois de dois dias de reuniões e um jantar na Casa Branca. "O dia de hoje é um dia histórico para a política mundial." O último encontro do presidente antes de embarcar de volta não poderia ser mais simbólico: uma reunião bilateral com o presidente da China, Hu Jintao. No dia anterior, ele havia se encontrado com outros pesos pesados, como o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, e do Japão, Taro Aso.

Além do compromisso sobre comércio internacional, o comunicado oficial trouxe um acordo sobre a necessidade de regular o sistema financeiro internacional e de atuar de forma coordenada para evitar uma recessão mundial. "O G-20 abriu muitas portas. Se vamos avançar ou não, depende de cada um. Os temas são complexos e ainda têm que ser discutidos em profundidade. Mas já é um avanço que todos tenham concordado em discutir esses temas", disse à DINHEIRO o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa. Um dos pontos mais surpreendentes foi a concordância de todos os países - inclusive dos Estados Unidos, em princípio contra qualquer tipo de supervisão externa - em se submeter ao programa de controle do setor financeiro (FSPA) do Fundo Monetário Internacional. Atualmente, dos 20 países representados na reunião, apenas 13 se submetem ao programa, um instrumento que pode apontar sinais de que as coisas não estão caminhando bem. "Os alarmes precoces são absolutamente necessários para evitar as crises", diz o diretor-gerente do FMI, Dominique Strauss-Kahn. O presidente Bush, que alguns dias antes havia

feito um discurso em defesa do capitalismo e contra a intervenção estatal na economia, saiu da reunião defendendo mudanças na regulação. "Um dos principais avanços foi estabelecer princípios e ações para adaptar nosso sistema financeiro à realidade do século 21. Parte da estrutura regulatória que está aí é do século 20", disse Bush. Outro ponto defendido pelo Brasil que foi aceito pelos demais países é a expansão do Fundo de Estabilidade Financeira, grupo que reúne bancos centrais, FMI e outros organismos financeiros, com o aumento da participação dos países emergentes. O G-20 também concordou com uma regulação flexível, que não acentue as flutuações de mercado - tanto em momentos de crescimento como de crise econômica -, maior clareza e transparência dos derivativos complexos e uma supervisão das agências de classificação de risco.

Mas se provocou aplausos dos incluídos, a consolidação do G-20 como o foro de discussão da crise também deu lugar a críticas. O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, disse que é importante que os emergentes estejam representados no G-20, mas lembrou que a ONU tem outros 170 países. O primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi, que assume a presidência do G-8 no ano que vem, não gostou de ver o grupo perder espaço. "A partir de 1º de janeiro, teremos a presidência do G-8, que não foi apagado pelo G-20. Certos problemas devem ser discutidos por nações cujas democracias estão consolidadas, enquanto outros países, do G-20, ainda estão no caminho para a democracia", afirmou Berlusconi, um dia depois da reunião em Washington. Soou como dor de cotovelo

 

Amorim fala sobre o incidente com o Equador

E o Mercosul mais uma vez sai enfraquecido... Apesar do Equador não ser membro efetivo como o Brasil, ele participa do processo de integração como membro associado.

24/11/2008 - 19h52

Amorim diz que interesses comerciais e políticos justificaram incidente diplomático

GABRIELA GUERREIRO
da Folha Online, em Brasília

O ministro Celso Amorim (Relações Exteriores) justificou nesta segunda-feira a decisão do governo brasileiro de convocar para retornar ao Brasil o seu embaixador no Equador, Antonio Marques Porto, ao afirmar que a diplomacia brasileira, apesar de defender a integração sul-americana, deseja ver "respeitados" os seus interesses na região. Amorim disse que o incidente diplomático com o Equador não foi provocado "de coração leve, com prazer ou satisfação" pelo governo brasileiro, mas pela necessidade do país preservar os seus interesses comerciais e políticos.

"Nós lamentamos. Nós não fazemos isso de coração leve, com prazer ou satisfação. O Brasil tem um grande empenho na integração sul-americana, um grande empenho em ajudar os países mais vulneráveis da região, claro que também sempre respeitados os nossos interesses. Agora, para que isso ocorra, certas condições também têm que estar presentes. Isso nós quisemos significar com esse chamado a serviço [do embaixador]", afirmou.

Amorim disse que o governo brasileiro foi pego de surpresa com a decisão do governo equatoriano de suspender o pagamento de dívida contraída com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), no total de US$ 243 milhões, para a construção no país da usina hidrelétrica San Francisco.

O ministro disse que, na véspera do anúncio equatoriano, o embaixador brasileiro em Quito se reuniu com o vice-ministro de Relações Exteriores do país vizinho e nada foi dito a respeito do empréstimo do BNDES.

"Desta vez, sem que tenha havido nenhuma pré-notificação ao Brasil --nós sabíamos coisas por vazamentos, declarações feitas à imprensa que muitas vezes eram não autorizadas --nós não sabemos que algo parecido poderia estar em cogitação", afirmou.

Amorim disse que o governo brasileiro não adotou postura semelhante com a Bolívia, quando houve invasão em refinaria da Petrobras, porque houve recuo do presidente Evo Morales --além da medida ter sido anunciada antes de ser efetivada.

"Não há nenhuma mudança de política externa. O que há são situações diferentes, diversas, por vários motivos. No caso da Bolívia era processo que vinha se desenhando. Eu transmiti ao presidente Morales o nosso desconforto. Uma semana depois ele retirou a ocupação. Embora tenha sido um gesto que tenha tido no plano simbólico um lado que não tenha nos agradado, ele se inseriu no meio do processo de negociação", afirmou.

Embaixador

Sem deixar o tom diplomático de lado, Amorim sinalizou que não há prazo para o embaixador Antonio Marques Porto retornar ao Equador. "Ele veio para consultas. As consultas não terminaram", disse o ministro.

A convocação do embaixador para retornar ao Brasil foi vista como um duro recado diplomático ao governo de Correa --que lamentou a decisão do governo brasileiro, mas garantiu que o pais não mudará de posição.

Amorim disse que, desde o telefonema entre Correa e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no último sábado (22), não houve nenhum outro contato do Equador em busca de uma solução para a crise diplomática.

As relações entre o Equador e o Brasil estão estremecidas desde que o presidente Rafael Correa decidiu expulsar do país a construtora Odebrecht, acusada de cometer falhas na construção da hidroelétrica San Francisco.

Correa assinou um decreto retirando o visto de funcionários da construtora Odebrecht e, na prática, expulsando-os do país. No mesmo decreto, Correa revogou ainda os vistos de cinco funcionários da também brasileira Companhia Furnas Centrais Elétricas.

O governo brasileiro chegou a adiar uma missão ao país vizinho que estava agendada para o mês passado em reação à decisão do Equador de expulsar a Odebrecht. Na ocasião, a ministra equatoriana María Isabel Salvador chegou a admitir abalos na relação com o Brasil.

Cassação de governadores

É inconcebível que passados 100 anos daquele cenário descrito na obra "Coronelismo, enxada e voto" ainda aconteça compras de voto e abuso do poder ecômico e político na eleições. Por outro lado, muitos dirão que é inconcebível a justiça ser tão dura no julgamento de casos relativos a situações tão corriqueiras como estas. É o Brasil brasileiro. Até o momento.


21/11/2008 - 18h09

Além de Cunha Lima, mais sete governadores podem ser cassados pelo TSE

RENATA GIRALDI
GABRIELA GUERREIRO
da 
Folha Online, em Brasília

O governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima (PSDB), pode ter sido o primeiro de uma série de outros sete governadores ameaçados de perderem seus mandatos. Depois de o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) decidir, por unanimidade, cassar o mandato do tucano, os demais governadores com processos no TSE correm o mesmo risco. As denúncias são, na sua maioria, por abuso de poder econômico e captação ilícita de votos.

Na lista de governadores sob ameaça de cassação, estão Jackson Lago (PDT), do Maranhão, Luiz Henrique da Silveira (PMDB), de Santa Catarina, Ivo Cassol (sem partido), de Rondônia, Marcelo Déda (PT), de Sergipe, Marcelo Miranda (PMDB), de Tocantins, José de Anchieta Júnior (PSDB), de Roraima, e Waldez Goés (PDT), do Amapá.

Dos sete processos em tramitação no TSE, o mais adiantado é o de Lago. O governador é acusado de suposta compra de votos, assim como Cassol e Anchieta Júnior --que respondem a processos semelhantes.

Luiz Henrique é acusado de abuso de poder e propaganda ilegal durante campanha eleitoral. Já o petista Déda responde a processos por abusos de poder econômico e político, assim como Waldez --que ainda é acusado de conduta proibida a agente público.

O governador de Santa Catarina, por sua vez, teve o julgamento suspenso em fevereiro deste ano. No processo, ele é acusado de uso indevido dos meios de comunicação, propaganda eleitoral ilegal do governo em jornais do Estado, emissoras de rádio e televisão --supostamente com as despesas pagas pelos cofres públicos.

Já o governador de Tocantins responde por propaganda eleitoral irregular e utilização ilegal de meios de comunicação.

Cassol, por sua vez, obteve no TSE liminar suspendendo a execução de decisão do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de Rondônia, que determinava o afastamento dele do cargo. O governador nega as acusações.

Ex-governadores também estão na relação de processados do TSE. O ex-governador de Tocantins Siqueira Campos (PSDB) é denunciado por fazer propaganda eleitoral irregular e utilizar meios de comunicação fora da lei, também para fins eleitoreiros, em 2006.

Decisão

Os ministros do TSE decidiram nesta quinta-feira, por unanimidade, cassar o mandato de Cunha Lima e de seu vice, José Lacerda Neto (DEM). Os dois são suspeitos de utilização de programas sociais para a distribuição irregular de dinheiro, via cheques, em um processo denominado Caso Fac (Fundação de Ação Comunitária).

Os advogados de defesa do governador e do vice informaram que entrarão com recursos no STF (Supremo Tribunal Federal) na tentativa de preservar os mandatos de ambos.

As denúncias contra Cunha Lima e Lacerda Neto se referem ao chamado Caso Fac, que trata de suposto uso político de programas assistenciais da entidade.

Segundo o processo, foram distribuídos 35 mil cheques para eleitores de baixa renda anexados a propaganda de governo.

As irregularidades teriam sido cometidas durante ano eleitoral de 2006, por intermédio de um convênio firmado entre a Fac e o Fundo de Combate à Pobreza

A vitória de Obama

O novo presidente dos EUA vem despertando pulsações de esperança nos cidadãos estadunidenses e em diversos cantos do mundo. Segundo o artigo de Marco Aurélio Nogueira, a vitória de Barack Obama, que une o perfil raconal-legal ao do líder carismático, não é o suficiente mas já é muita coisa.

O efeito Obama

A eleição de Barack Obama para a Presidência dos Estados Unidos já foi submetida a todo tipo de avaliação. Porém, como todo fato histórico, continua a desafiar os analistas.

Foi sem dúvida o principal acontecimento de um ano sacudido mais pela crise financeira internacional do que por fatos políticos particularmente expressivos. Terá força para repor a política no centro da vida e das atenções, ao menos nos Estados Unidos? Muito se falou da dimensão simbólica da vitória de Obama. Um negro, que veio de baixo, um político formado por Harvard, estranho às aristocracias políticas norte-americanas, não poderia mesmo deixar de produzir impacto, despertar emoções, dar esperança a milhões de pessoas que se sentem derrotadas e humilhadas, que ainda se lembram do apartheid racial que devassou a convivência e a dignidade humana dentro e fora da nação tida como “pátria da Liberdade”. Mas Obama também incendiou os jovens e conseguiu assimilar o eleitorado feminino que torcia por Hillary Clinton. Estabeleceu empatia com todos os setores da sociedade americana. Foi emocionante ver as multidões que o saudaram em Chicago e comemoraram sua vitória em várias partes do mundo. Num momento de refluxo no envolvimento com a política, a centelha de mobilização que acompanhou Obama merece no mínimo um acompanhamento cuidadoso.

Dado o peso dos Estados Unidos, tudo o que ali acontece pode repercutir no modo como se vive no mundo. Mas não em termos imediatamente econômicos, pois parece difícil que se consiga, pelo efeito mágico de um gesto, estancar de imediato a crise financeira, modificar a predisposição consumista das massas e arrefecer o afã desenvolvimentista que grassa forte neste início de século. Consumismo desenfreado e crescimento econômico a qualquer preço são duas das principais pragas da modernidade, e a elas devemos imputar boa parte das mazelas com que convivemos. Trocar consumo e desenvolvimento por investimentos sociais, por democracia, igualdade, respeito ao meio ambiente e desaquecimento, não é seguramente operação simples. Requererá décadas de empenho político, criatividade e reeducação.

Obama não tem como nos fornecer isso, mas pode agir como catalisador. Pode, por exemplo, repor na cena política uma agenda progressista, voltada mais para a população do que para a economia, ainda que sem abandonar a convicção de que é preciso ajudar os mercados a sair da lambança em que se meteram. Voltar-se para a população significa fazer o governo funcionar para promover as pessoas, provê-las de serviços e suportes que as façam crescer e viver com dignidade. Obama pode ajudar a que se passe a ver o bom governo como aquele que colabora para que se tenha boa vida, não tanto boa economia. Pode ser uma diferença sutil, mas não deixa de ser decisiva. Dar-se-ia o mesmo na frente administrativa. Uma guinada progressista de Obama jogaria por terra o palavrório insosso do “choque de gestão” e do Estado mínimo.

Muitos manifestaram preocupação com o protecionismo do Partido Democrata e do próprio Obama, que desde a campanha sempre se manifestou favorável aos interesses de seu país. Os que não gostaram disso pareciam querer que o novo presidente governasse para o mundo e para os países mais pobres. O protecionismo democrata é tradicional. Sempre existiu e sempre existirá, especialmente em momentos de crise aguda, como o atual.

Uma eventual agenda progressista de Obama não abandonará o protecionismo, e não fará isso por vários motivos. Mas poderá contribuir para que se criem novos canais de negociação, novos relacionamentos comerciais e novas modalidades de cooperação e ajuda internacional. Se for assim, será um passo de gigante.

Não houve quem não lembrasse que uma coisa é o discurso de campanha, outra coisa é a prática efetiva do governo. Trata-se de uma lembrança oportuna, ainda que óbvia e elementar. Todo governante eleito vive tal situação, mesmo aqueles que prometem pouco e se apresentam como técnicos ou “gerenciais”. Campanha e governo implicam lógicas distintas, condutas e discursos específicos. O importante é compreender como o candidato se prolonga no governante. Política e governo são sempre um ator e certas circunstâncias. Faz-se o que se pode, não o que se deseja fazer. Mas sempre dá para ligar o desejável e o possível, graduá-los e equilibrá-los, de modo a que a prática dura e fria do governo contenha uma dose de fantasia e facilite às pessoas a continuidade de uma esperança. Obama enfrentará dificuldades enormes para transformar em fatos muitos de seus compromissos de campanha. Mas poderá fazer com que seus recuos e fracassos se convertam em fatores de mobilização para novas tentativas futuras.

Obama tem tais condições porque representa um sopro de renovação e vem embalado pelo entusiasmo das multidões. Sua legitimidade mistura respeito racional-legal e adesão ao carisma do líder. Representa o negro pobre e o branco liberal, o branco atingido pela crise e o negro progressista, a classe média que se empobreceu e as elites democráticas, os jovens, os mais velhos e as mulheres de todas as etnias.

Torcer por seu sucesso, e admitir que ele possa acontecer, não autoriza ninguém a se pôr diante dele com a ingênua expectativa de que tudo agora será diferente. Obama não trará o céu à terra até mesmo porque não se comprometeu com isso. Não é anticapitalista nem reformista convicto, menos ainda um socialista moderado. É somente um político jovem, talentoso, pragmático e determinado, em cujas veias parece correr o sangue secular do que há de melhor na sociedade americana. Mais que um sonho, ele expressa o fim de um pesadelo, a era Bush. Pode não ser suficiente, mas é sem dúvida muita coisa. [Publicado em O Estado de S. Paulo, 22 de novembro de 2008, p. A2] 

sábado, 22 de novembro de 2008

Crítica à extrema esquerda

Nesse artigo Emir Sader critica com veemência a extrema esquerda brasileira e afirma: "[...] Confirmação desse isolamento e de perda de sensibilidade e contato com a realidade é que não se vê nenhum tipo de balanço autocrítico, sequer constatação de derrota da parte da extrema esquerda. Se afirma que se fizeram boas campanhas, não importando os resultados, como se se tratassem de pastores religiosos que pregam no deserto, com a consciência de que representam uma palavra divina, que ainda não foi compreendida pelo povo. (Marx dizia que a pequena burguesia sofre derrotas acachapantes, mas não se autocritica, não coloca em questão sua orientação, acredita apenas que o povo ainda não está maduro para sua posições, definidas essencialmente como corretas, porque corresponderiam a textos sagrados da teoria.)"


21/11/2008

A crise da extrema esquerda

Emir Sader

Os resultados das eleições municipais vieram corroborar o que o cenário político nacional já permitia ver: o esgotamento do impulso da extrema esquerda, que tinha sido relançada no começo do governo Lula. A votação em torno de 1% de dois dos seus três parlamentares, candidatos a prefeito em São Paulo e no Rio de Janeiro, com votações significativamente menores do que as que tiveram como candidatos a deputados, sem falar na diferença colossal em relação à candidata à presidência, apenas dois anos antes – são a expressão eleitoral, quantitativa, que se estendeu por praticamente todo o país, do esgotamento prematuro de um projeto que se iniciou com uma lógica clara, mas esbarrou cedo em limitações que o levam a um beco difícil, se não houver mudança de rota.

A Carta aos Brasileiros, anunciando que o novo governo não iria romper nenhum compromisso – nesse caso, com o capital financeiro, para bloquear o ataque especulativo, medido pelo “risco Lula” -, a nomeação de Meirelles para o Banco Central e a reforma da previdência como primeira do governo – desenharam o quadro de decepção com o governo Lula, que levaria à saída do PT de setores de esquerda. A orientação assumida pelo governo inicialmente, em que a presença hegemônica de Palocci fazia primar os elementos de continuidade com o governo FHC sobre os de mudança – estes recluídos basicamente na política externa diferenciada e em setores localizados – e a reiteração de um governo estritamente neoliberal davam uma imagem de um governo que era considerado pelos que abandonavam o PT, como irreversivelmente perdido para a esquerda.

O dilema para a esquerda era seguir a luta por um governo anti-neoliberal dentro do PT e do governo ou sair para reagrupar forças e projetar a formação de uma nova agrupação. Naquele momento se cogitou a constituição de um núcleo socialista, dos que permaneciam e dos que saíam do PT, para discutir amplamente os rumos a tomar. Não apenas cabia uma força à esquerda do PT, como se poderia prever que ela seria engrossada por setores amplos, caso a orientação inicial do governo se mantivesse.

Dois fatores vieram a alterar esse quadro. O primeiro, a precipitação na fundação de um novo partido – o Psol -, com o primeiro grupo que saiu do PT – em particular a tendência morenista – passando a controlar as estruturas da nova agremiação. Isto não apenas estreitou organizativamente o novo partido, como o levou a posições de ultra-esquerda, responsáveis pelo seu isolamento e sectarização. A candidatura presidencial nas eleições de 2006 agregou um outro elemento ao sectarismo, que já levaria a uma posição de eqüidistância em relação ao governo Lula. O raciocínio predominante foi o de que o governo era o melhor administrador do neoliberalismo, porque além de mantê-lo e consolidá-lo, o fazia dividindo e confundindo a esquerda, neutralizando a amplos setores do movimento de massas. Portanto deveria ser derrotado e destruído, para que uma verdadeira esquerda pudesse surgir. O governo Lula e o PT passaram a ser os inimigos fundamentais da nova agrupação.

Esse elemento favoreceu a aliança – já desenhada no Parlamento, mas consolidada na campanha eleitoral – com a direita – tanto com o bloco tucano-pefelista, como com a mídia oligárquica -, na oposição ao governo e à reeleição de Lula. A projeção midiática benevolente da imagem da candidata do Psol lhe permitia ter mais votos do que os do seu partido, mas comprometia a imagem do partido com uma campanha despolitizada e oportunista, em que a caracterização do governo Lula não se diferenciava daquela feita na campanha do “mensalão”. Como se poderia esperar, apesar de algumas resistências, a posição no segundo turno foi a do voto nulo, isto é, daria igual para o novo partido a vitória do neoliberal duro e puro Alckmin ou de Lula. (Se tornava linha nacional oficial o que já se havia dado nas primeiras eleições em que o Psol participou, as municipais, em que, por exemplo, em Porto Alegre, diante de Raul Pont e Fogaça, no segundo turno, se afirmou que se tratava da nova direita contra a velha direita e se decidiu pelo voto nulo.)

Uma combinação entre sectarismo e oportunismo foi responsável pelo comprometimento da orientação política do novo partido, que o levou a perder a possibilidade de formação de um partido à esquerda do PT, que se aliasse a este nos pontos comuns e lutasse contra nos temas de divergência. O sectarismo levou a que sindicatos saíssem da CUT, sem conseguir se agrupar com outros, enfraquecendo a esquerda da CUT e se dispersando no isolamento. Levou a que os parlamentares do Psol votassem contra o governo em tudo – até mesmo na CPMF – e não apoiassem as políticas corretas do governo – como a política internacional, entre outras. Esta se dá porque o governo brasileiro tem estreita política de alianças com as principais lideranças de esquerda no continente – como as de Cuba, Venezuela, Equador, Bolívia -, que apóiam o governo Lula, o que desloca completamente posições de ultra-esquerda – que se reproduzem de forma similar a dessa corrente no Brasil nesses países -, deixando de atuar numa dimensão fundamental para a esquerda – a integração continental.

Por outro, o governo Lula passou a outra etapa, com a saída de vários de seus ministros, principalmente Palocci, conseguindo retomar um ciclo expansivo da economia e desenvolvendo efetivas políticas de distribuição de renda, ao mesmo tempo que recolocava o tema do desenvolvimento como central – deslocando o da estabilidade, central para o governo FHC -, avançando na recomposição do aparelho do Estado, melhorando substancialmente o nível do emprego formal, diminuindo o desemprego, entre outros aspetos. 

A caracterização do governo Lula como expressão consolidada do neoliberalismo, um governo cada vez mais afundado no neoliberalismo – reedição de FHC, de Menem, de Carlos Andrés Perez, de Fujimori, de Sanchez de Losada – se chocava com a realidade. 

Economistas da extrema esquerda continuaram brigando com a realidade, anunciando catástrofes iminentes, capitulações de toda ordem, tentando resgatar sua equivocada previsão sobre os destinos irreversíveis do governo, tentando reduzir o governo Lula a uma simples continuação do governo FHC, reduzindo as políticas sociais a “assistencialismo”, mas foram sistematicamente desmentidos pela realidade, que levou ao isolamento total dos que pregam essas posições desencontradas com a realidade.

O isolamento dessas posições se refletiu no resultado eleitoral, em que todas as correntes de ultra-esquerda ficaram relegadas à intranscendência política, revelando como estão afastadas da realidade, do sentimento geral do povo, dos problemas que enfrenta o Brasil e a América Latina. As políticas sociais respondem em grande parte pelos 80% de apoio do governo,rejeitado por apenas 8%. Para a direita basta a afirmação do “asisistencialismo” do governo e da desqualificação do povo, que se deixaria corromper por “alguns centavos”, mas a esquerda não pode comprá-la, por reacionária e discriminatória contra os pobres.

Confirmação desse isolamento e de perda de sensibilidade e contato com a realidade é que não se vê nenhum tipo de balanço autocrítico, sequer constatação de derrota da parte da extrema esquerda. Se afirma que se fizeram boas campanhas, não importando os resultados, como se se tratassem de pastores religiosos que pregam no deserto, com a consciência de que representam uma palavra divina, que ainda não foi compreendida pelo povo. (Marx dizia que a pequena burguesia sofre derrotas acachapantes, mas não se autocrítica, não coloca em questão sua orientação, acredita apenas que o povo ainda não está maduro para sua posições, definidas essencialmente como corretas, porque corresponderiam a textos sagrados da teoria.)

Não fazer um balanço das derrotas, não se dar conta do isolamento em que se encontram, da aliança tácita com a direita e das transformações do governo Lula – junto com as da própria realidade econômica e social do país –, da constatação do caráter contraditório do governo Lula, que não deveria ser se inimigo fundamental revelariam a perda de sensibilidade política, o que poderia significar um caminho sem volta para a extrema esquerda. Seria uma pena, porque a esquerda brasileira precisa de uma força mais radical, que se alie ao PT nas coincidências e lute nas divergências, compondo um quadro mais amplo e representativo, combinando aliança a autonomia, que faria bem à esquerda e ao Brasil.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Falta de diálogo na América do Sul

A falta de diálogo não faz bem a nenhum relacionamento, ainda mais a relacionamentos entre países. É fato que o Brasil é visto como um país imperialista, explorador e auto-referenciado por muitos na América do Sul, tal como o EUA é visto por muitos no Brasil. Em parte, há razão para isso. Mas a falta de diálogo não auxilia os demais países, e dificulta muito um processo de integração na América do Sul.

Embaixador do Brasil no Equador é convocado para consultas

Governo de Rafael Correa pede o fim do pagamento ao financiamento concedido para obras da Odebrecht

Agência Estado

SÃO PAULO - O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, afirmou que o governo brasileiro chamou o embaixador do Brasil no Equador para consultas depois do governo equatoriano entrar com pedido junto à Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional para suspender o pagamento da dívida para financiamento da hidrelétrica São Francisco junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), construída no país pela empresa brasileira Norberto Odebrecht.  "O governo recebeu com muita preocupação a decisão do Equador de suspender o pagamento da dívida ao BNDES", afirmou Amorim durante breve declaração no final da Conferência Internacional sobre Biocombustíveis, em São Paulo. Por isso "chamamos nosso embaixador no Equador para consultas, e todo mundo que conhece algo de diplomacia sabe o que isto significa", destacou.

 O presidente do Equador, Rafael Correa, disse na quinta-feira, durante a divulgação dos resultados de uma auditoria sobre a dívida do país, que o governo tomou providências legais contra uma dívida contraída junto ao BNDES, por meio da construtora Odebrecht. A declaração foi reforçada por Jorge Glas, presidente do Fundo de Solidariedade do Equador, órgão estatal vinculado ao setor de geração e transmissão de energia elétrica no país. Em entrevista ao jornal local El Universo, ele explicou que o governo apresentou um pedido de arbitragem na Câmara de Comércio Internacional, em Paris, solicitando a suspensão da cobrança do empréstimo devido a ilegalidades contratuais. Segundo Glas, a dívida é de US$ 286 milhões.

  "A decisão do governo equatoriano foi anunciada em evento público sem prévia consulta ou notificação ao governo brasileiro", afirmou nota distribuída à imprensa. O chanceler brasileiro acrescentou que o BNDES ainda vai se pronunciar sobre as alegações feitas pelo governo equatoriano relativas ao contrato de financiamento. "O governo brasileiro considera que a natureza e a forma de adoção das medidas tomadas pelo governo equatoriano não se coadunam com o espírito de diálogo, de amizade e de cooperação que caracteriza as relações entre Brasil e Equador", diz a nota.

 Segundo o governo do Equador, a responsabilidade da dívida com o BNDES é da Odebrecht e não de Quito. Procurado pela Agência Estado, o BNDES informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que não irá se pronunciar sobre o assunto e que possíveis pronunciamentos sobre o tema só poderão ser considerados quando o BNDES for comunicado oficialmente sobre a instauração do processo. Correa já havia ameaçado não pagar o empréstimo em setembro, argumentando que o dinheiro, utilizado para financiar as obras da hidrelétrica de San Francisco, possuía "graves irregularidades". A usina foi construída pela Odebrecht e começou a operar em meados do ano passado, mas interrompeu as operações em junho por problemas na construção. Quito depois expulsou a Odebrecht do país.

 Caso Odebrecht

 Correa expulsou a empresa de seu país numa disputa a respeito de uma central hidrelétrica. Aliado do governo venezuelano, Correa assinou um decreto, em 23 de setembro, ordenando o embargo dos bens da Odebrecht, a ocupação militar das obras em andamento e a proibição de que funcionários da empreiteira deixassem o país.

 A central San Francisco, construída pelo consórcio Odebrecht-Alstom-Vatech, foi inaugurada em 2007 e, em junho deste ano, começou a apresentar problemas, sendo logo depois fechada. A hidrelétrica tinha capacidade de fornecer 12% da energia consumida no país. A Odebrecht tentou um acordo com o governo equatoriano, que foi rejeitado por Rafael Correa no começo do mês passado.

 A dívida do Equador com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a construção da hidrelétrica de San Francisco ultrapassa US$ 460 milhões. O valor inclui os juros cobrados sobre os US$ 242 milhões emprestados pelo banco para financiar as obras.

 'Dívida ilegal'

 A medida em relação ao banco estatal brasileiro foi anunciada junto com um relatório da Comissão de Auditoria da Dívida Externa, que afirma que uma parte da dívida externa do país é ilegal e que poderá não ser paga. A Comissão considera que a negociação prejudicou os interesses do país. Os auditores afirmaram que os organismos multilaterais promoveram um endividamento "desleal" e que o Fundo Monetário Internacional (FMI) teria "incentivado" esse endividamento.

 Ao final da apresentação do relatório na quinta, Correa disse que buscará não pagar a dívida e que pretende punir os responsáveis equatorianos encarregados da negociação. "Buscaremos não apenas castigar os culpados, mas também não pagar a dívida ilegal, ilegítima, corrupta", afirmou Correa.

 O presidente equatoriano disse ainda que os resultados da auditoria devem determinar a futura política financeira do país. Uma das suas primeiras decisões agora será definir se o país pagará a parcela dos juros da dívida externa que vence em 15 de dezembro.

 Se decidir não pagar a parcela de US$ 30,4 milhões o governo vai na prática decretar a moratória da dívida. Outra possibilidade seria propor uma renegociação com os credores.

 Se optar por não pagar a dívida, a ministra de Finanças María Elsa Viteri adiantou que seu país poderia recorrer a países amigos, como a Venezuela, para obter financiamento, diante de uma provável restrição de crédito das instituições financeiras internacionais.

Limitação dos países emergentes na crise

Interessante análise sobre a condição dos países emergentes na crise e sobre a trajetória de Brasil e Coréia desde as crises dos anos 1990.

Salvem os mercados emergentes
Dani Rodrik - Valor online
21/11/2008

(...) Vejamos o que aconteceu com a Coréia do Sul e o Brasil. Os dois países experimentaram crises cambiais no passado recente - a Coréia do Sul em 1997-1998 e o Brasil em 1999 - e ambos subseqüentemente adotaram medidas para elevar a sua resistência financeira. Eles reduziram a inflação, deixaram suas moedas flutuar, acumularam superávits externos ou pequenos déficits e, o que é mais importante, acumularam montanhas de reservas cambiais (que agora excedem tranqüilamente as suas dívidas externas de curto prazo). O bom comportamento financeiro do Brasil foi recomendado já em abril deste ano, quando o Standard & Poor´s elevou a sua nota de crédito para nível de investimento (a Coréia do Sul já obteve nível de investimento há anos).

Apesar disso, ambos estão sendo duramente castigados nos mercados financeiros. Nos dois meses passados, suas moedas perderam cerca de 25% do seu valor ante o dólar dos EUA. Seus mercados de ações declinaram bem mais (40% no Brasil e 33% na Coréia do Sul). Nada disso pode ser explicado pelos fundamentos econômicos. Os dois países experimentaram um período de crescimento robusto recentemente. O Brasil é um exportador de commodities, ao passo que a Coréia do Sul não é. A Coréia do Sul depende enormemente de exportações a países ricos, e o Brasil, bem menos.

Estes e demais países emergentes são vítimas de uma corrida racional rumo à segurança, exacerbada por um pânico irracional. As garantias públicas que os países ricos estenderam aos seus setores financeiros expuseram de forma mais clara a linha crítica demarcatória existente entre ativos "seguros" e "arriscados", sendo que os mercados emergentes estão claramente nesta última categoria. Os fundamentos econômicos ficaram pelo caminho.

Para piorar as coisas, os mercados emergentes são privados da única ferramenta que os países adiantados empregaram para estancar os seus próprios pânicos econômicos: recursos fiscais internos ou liquidez interna. Os mercados emergentes necessitam de moeda estrangeira e, portanto, de apoio externo.

O que precisa ser feito está claro. O Fundo Monetário Internacional (FMI) e os bancos centrais do G-7 precisam atuar como emprestadores globais de última instância e fornecer liquidez ampla - rapidamente e com poucas restrições - para apoiar as moedas dos mercados emergentes. A dimensão da provisão de recursos necessária provavelmente chegará a centenas de bilhões de dólares dos EUA, e superará tudo o que o FMI já tenha feito até agora. Mas não há nenhuma escassez de recursos. Se for preciso, o FMI poderá emitir direitos especiais de saques (SDRs) para gerar a liquidez global necessária.

Além disso, a China, que detém quase US$ 2 trilhões em reservas cambiais, deve ser parte desta missão de resgate. O dinamismo da economia chinesa é extremamente dependente das exportações, que poderão sofrer muito com um colapso dos países emergentes. Na verdade, a China, com sua necessidade de crescimento elevado para pagar pela paz social, pode ser o país que mais corre risco com uma grave queda na atividade econômica global.

O interesse próprio indisfarçado também deve convencer os países avançados. O colapso continuado das moedas dos mercados emergentes e suas conseqüentes pressões comerciais lhes dificultarão ainda mais a tentativa de impedir um aumento substancial nos níveis da taxa de desemprego. Na ausência de um escudo para as finanças dos países emergentes, o cenário apocalíptico de um ciclo vicioso protecionista que relembra a década de 1930 já não pode ser descartado.

Dani Rodrik, professor de Economia Política na Escola de Governo John F. Kennedy da Universidade Harvard, é o primeiro ganhador do Prêmio Albert O. Hirschman do Social Science Research Council. © Project Syndicate/Europe´s World, 2008. www.project-syndicate.org

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Aposentadoria e salário mínimo

A dissonância entre os reajustes do salário mínimo e das aposentadorias superiores ao mínimo não deixa de ser um posicionamento político: de combate à pobreza. No entanto, o problema previdenciário no Brasil é muito mais complexo do que isso e tem de ser "resolvido" com urgência.


Aposentadoria tem defasagem de 84% sobre mínimo

da Folha Online

Nos últimos 13 anos, os aposentados que recebem valores acima do salário mínimo acumularam uma defasagem de 84,14% em suas aposentadorias, informa o blog do Josias.

Entre 1995 e 2008, os 16 milhões de aposentados que recebem o equivalente a um salário mínimo tiveram reajustes de 104,20% acima da inflação. No mesmo período, os 8 milhões que recebem valores acima do mínimo tiveram reajustes menores: 20,06% além da variação inflacionária.

Os dados constam de um estudo preparado pela Comissão de Orçamento do Congresso. Nesta terça (18), o ministro José Pimentel (Previdência) vai ao Congresso para debater a recomposição das aposentadorias.

O governo defende que não tem dinheiro para a atualização dos ganhos de aposentados. Em 2008, o Tesouro estima gastar R$ 36,59 bilhões com os aposentados. Pelas contas dos técnicos do Congresso, a cifra deve chegar a R$ 104,8 bilhões se todos os benefícios forem reajustados na mesma proporção.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Mapa eleitoral do Estadão.com.br

Ferramenta muito interessante para quem gosta de política. Podemos comparar os resultados das eleições municipais desde 1996 até 2008, com diversos indicadores sócio-econômicos.


Alguns dados interessantes: grande crescimento do PMDB em quase todos os cruzamentos; partidos da base governista crescem nas cidades que têm grande porcentagem de população atendida pelo Bolsa-Família (PMDB, PTB e PT); DEM cai em quase todas as situações, com exceção do orçamento administrado e do total de eleitores, claramente puxado pela eleição da cidade de São Paulo.
Vale a pena olhar.

sábado, 8 de novembro de 2008

Imagem versus Conteúdo

Um outro problema a respeito dessa quantia é: cadê os gastos com formuladores de políticas públicas? A imagem é passada a este alto custo, mas e as propostas? Estão no segundo plano, claro.

Pesquisa aponta custo de US$ 53 mi para se eleger um prefeito
Estadão on line
Associação de consultores calcula custo da campanha por voto: US$ 14 para prefeito e US$ 8 para vereador
O levantamento foi feito com dados de 80 consultores da Abcop, explica o presidente da associação Carlos Manhanelli, e considerou uma campanha "partindo do zero", ou seja, sem nenhum tipo de estrutura partidária: "Era o jeito de calcular. Os gastos vão desde a faxineira e o escritório até o estrategista. Tudo mesmo". Por isso, segundo ele, há diferença entre os valores calculados acima e a previsão de limite de gastos informada pelos candidatos ao Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) antes do início da campanha. Kassab informou limite de gastos de R$ 30 milhões e Marta, R$ 25 milhões. 
"Mas numa eleição, os prefeitos, por exemplo, já contam com uma máquina para trabalhar e esse custo é reduzido. Também têm a estrutura a partidária, o diretório do partido, os voluntários etc.", explica Manhanelli, que também dá aulas de marketing político na Universidade de Salamanca, na Espanha, e foi responsável por 13 campanhas eleitorais este ano. Ele só não conta quais. "Quem tem que brilhar é o candidato", justifica. Ainda sobre as campanhas, o consultor política explica que o Brasil exporta sua expertise na área e realiza campanhas eleitorais em países da América Latina (Argentina, Equador, Bolívia) e África (Angola e Congo). 
O marco da influência do marketing político nas campanhas é 1989, data da primeira eleição à Presidência da República após o fim do período militar, na disputa entre Fernando Collor de Mello e Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República, diz o consultor político e professor da USP, Gaudêncio Torquato. "O marketing político usa técnicas que procuram maximizar potenciais e minimizar pontos fracos do candidato", afirma. Torquato explica que o trabalho se baseia em cinco eixos: pesquisa (quantitativa e qualitativa); construção do discurso (propostas e promessas) com base na pesquisa; plano de comunicação com uso de várias mídias; articulação com a sociedade organizada (ONGs, por exemplo); e mobilização das massas (carreatas, comícios, caminhadas etc.). 
Torquato critica o domínio dos publicitários na área, particularmente Duda Mendonça, responsável por campanhas vitoriosas como a de Lula, em 2002, e a de Paulo Maluf à Prefeitura de São Paulo, em 1992. "Inventaram que o marketing político é basicamente campanha de televisão. Começou a se dar ênfase nas campanhas televisivas. Fizeram campanhas belíssimas, porém esqueceram outro eixos de campanha publicitária", disse o professor da USP.
Há quem discorde. Para o professor da ESPM, Emmanuel Publio Dias, Duda Mendonça sabe fazer campanha "principalmente vencedora". "Quando ele pega alguém com potencial de vencer, ele faz disparar. Ele é muito popular, linguagem popular bem fácil, ele entende de televisão. Na campanha deste ano, Duda Mendonça colecionou maus momentos ao ter sua equipe reduzida na campanha de Marcelo Crivella (PRB) por falta de dinheiro. Mas também somou vitórias à sua trajetória, como os petistas Luizianne Lins, em Fortaleza, e João da Costa, no Recife.Andréia Sadi e Gisele Silva, do estadao.com.br
SÃO PAULO - O custo médio de uma campanha para prefeito nas últimas eleições foi de US$ 14 por voto e para vereador, US$ 8 por voto, segundo levantamento da Associação Brasileira de Consultores Políticos (Abcop), que reúne profissionais que trabalham em campanhas eleitorais. Considerando esses valores, o custo da campanha do prefeito reeleito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), seria de US$ 53 milhões (R$ 116,6 milhões), multiplicando-se os US$ 14 pelos 3.790.558 votos que ele obteve no segundo turno. Ainda seguindo esse cálculo, Marta Suplicy, candidata do PT, teria gasto US$ 34,3 milhões (R$ 75,5 milhões, equivalente a 2.452.527 votos). São Paulo é o maior colégio eleitoral do País, com 8,2 milhões de eleitores e, portanto, é onde se concentrariam os maiores gastos de campanha.

G-20 e as propostas de combate à crise

Talvez estejamos vendo o aprofundamento do poder do G-20, e conseqüentemente do Brasil, na política econômica mundial.  

Lula vai atacar a ''economia irreal'' e pedir limites

Discurso do presidente na abertura do encontro, hoje, deverá ter um recado duro aos "causadores da crise"


Estadão on line

Decidido a dar um duro recado aos países ricos, onde começou a crise, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve defender hoje que o sistema financeiro fique mais fortemente vinculado à economia real e não mais a papéis especulativos, que refletem uma riqueza muitas vezes inexistente. Esse deverá ser o foco do discurso de hoje, na abertura da reunião do G-20 Financeiro, que reúne presidentes de bancos centrais (BCs) e ministros de finanças dos países desenvolvidos e dos principais emergentes.

A grande quantidade de papéis lastreados em hipotecas imobiliárias sem garantias (subprime) são um exemplo do que o governo brasileiro considera um produto financeiro que não reflete a economia real. Avalia-se que títulos dessa qualidade deixaram a economia suscetível à crise financeira que tomou conta do mundo e ameaça transformar-se numa forte retração econômica.

O governo brasileiro tem se queixado do fato de os países emergentes estarem pagando caro por uma crise que não causaram. Na visão do Planalto, é necessária alguma limitação ao sistema financeiro e esse limite teria de ser dado pelos estados, de forma coordenada.

Em seu discurso, que ainda estava recebendo os últimos retoques ontem à noite, Lula deverá fazer referência ao novo governo norte-americano. Entre os assessores palacianos, foi bem-recebida a declaração do presidente eleito, Barack Obama, de que sua prioridade zero será o combate à crise. Isso foi visto como sinal de boa disposição para discutir as mudanças nos organismos internacionais que vêm sendo pleiteadas pelo Brasil. "Sem o apoio dos Estados Unidos, não tem possibilidade de reforma", reconhece um auxiliar do presidente.

Lula deverá defender, em seu discurso, que o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial sejam redesenhados de forma a dar mais poder aos países emergentes. É bandeira antiga do governo brasileiro mudar a relação de poder nesses organismos, que refletem o status econômico do mundo pós-guerra e não dá voz a países que ganharam importância desde então, como o Brasil e a Austrália, por exemplo. 

Embora sejam sócios, esses países jamais ocuparam a presidência desses organismos. Além disso, Europa e Estados Unidos têm votos suficientes para bloquear qualquer proposta que não seja de seu interesse.

A reforma dessas instituições multilaterais foi defendida por Lula também num artigo escrito para a revista G-20, que circulou ontem. "O Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial têm de se adaptar às novas realidades ou perder a relevância", escreveu o presidente. 

Ele acrescenta que os desafios que se colocam no mundo atual, como a crise, o aquecimento global, a segurança energética e o combate à pobreza, não podem mais ser enfrentados sem uma participação ativa dos países emergentes.

Nesse quadro, Lula defendeu o fortalecimento do G-20, que foi criado em 1999 justamente a partir da constatação que países importantes na economia mundial não tinham um foro internacional para coordenar políticas com os países desenvolvidos.

"A criação e o fortalecimento de fóruns mais diversos e representativos, como o G-20, constituem um passo essencial na formação de um sistema internacional de tomada de decisões que responda às necessidades e expectativas dos dias atuais."